10.24.2010

A POESIA NÃO É CONHECIMENTO, NEM COMUNICAÇÃO

A POESIA NÃO É CONHECIMENTO, NEM COMUNICAÇÃO

É impossível definir a poesia como uma «comunicação» estabelecida com meras palavras, mesmo que estas tenham um conteúdo psíquico, sensorial, afectivo ou conceptual, porque as mesmas características distinguem a literatura, e em geral, todo o género de expressão. O que é comum a várias disciplinas não pode individualizar apenas uma. O acto poético não é a transmissão puramente verbal de uma realidade anímica. Um discurso político ou um mais crítico não os podemos aceitar como Poesia, e contudo esses esforços da inteligência são comunicações de estados psíquicos.
A poesia não é conhecimento, nem comunicação. Não é conhecimento, porque sob o ponto de vista estético a Arte não é, nem será nunca uma actividade cognoscitiva. A Ciência e a Filosofia são actividades de conhecimento, enquanto que a Poesia pretende relações entre elementos reais. Não é comunicação, porque nesse caso pressuporia uma finalidade de ordem lógica e prática...
Nem virtudes rítmicas, nem qualidades eufónicas, bastam para explicar o que há no poema. As próprias palavras, expressões e imagens, vão perdendo com o tempo e a arbitrariedade do uso, o seu fundamental significado e a sua força de elementos vivos e comunicativos. Daí a resistência da Poesia a uma definição.
Será que a Poesia se sente mas não se exprime? Está lançado o repto aos nossos leitores para nos enviarem os seus comentários e os vossos poemas.

Joaquim Carlos

PSICOLOGIA DO VENCIDO

Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigénesis da infância,
A influência má dos signos do Zodíaco.

Profundíssimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme - este operário das ruínas -
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há-de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!

(Augusto dos Santos)

A ARTE

Tem a música o poder
de tornar o homem f'liz;
nem há quem saiba dizer
tudo quanto ela nos diz.

A arte é dom de quem cria,
por isso não é artista
aquele que só copia
aquilo que tem à vista.

Da música a melodia
diz, pela alma falando,
mais do que a boca diria
muitas horas conversando.

A arte é força imanente:
não se ensina, não se aprende,
não se compra, não se vende,
nasce e morre com a gente.

(António Fernandes Aleixo)

FILOSOFIA

Que importa perder a vida
em luta contra a traição,
se a Razão, mesmo vencida,
não deixa de ser Razão?

Que diriam do honesto
se não houvesse o velhaco?
O forte vale, e de resto,
o seu valor vem do fraco.

E assim, lição por lição,
o que aos poucos aprendemos
de outros a outros daremos
que outros a outros darão.

Não sei se sei, sou dos tais
a quem pouco saber cabe,
mas sei que é saber demais
a gente saber que sabe.

Gosto de apertar a mão
áspera dos calos que tem,
também as côdeas do pão
são ásperas, mas sabem bem.

(António Fernandes Aleixo)

FRATERNIDADE E ESPERANÇA


Querido irmão, és muito novo;
se o mundo assim continua,
a culpa é minha e é tua,
porque nós somos o povo.

E o povo, a crer na mentira,
dorme num sono profundo,
sofre um pesadelo eterno,
que faz com que ele prefira
o inferno deste mundo
por medo desse outro inferno.

Fingem-se ao bem dedicados,
muitos com os curandeiros,
p'ra não os vermos estranhos;
porque os lobos disfarçados
com as peles dos cordeiros
melhor destroem rebanhos.

Quando a verdade os aterra,
querem a moral pregar,
prometendo no céu dar
o que nos roubaram na terra.

O mundo está na infância,
e adulto só pode ser,
quando desaparecer
do povo a ignorância.

(António Fernandes Aleixo)

(Fecho do Auto da Vida e da Morte).

... A vida dos artifícios,
das ilusões e dos vícios,
como era falsa, caíu.
Há-de cair, recair,
até se regenerar,
para que possa ficar
como há-de ser no provir.

Eu sou a vida a seguir,
escola da humanidade;
sou aquilo que a vaidade
não conseguiu destruir.

Sou a vida: vou seguindo.
com vontade e persistência,
aos vindouros transmitindo
todo o bem quanto a ciência
p'ra o mundo for produzindo.

(António Fernandes Aleixo)

ESPERANÇA

O MUNDO SÓ PODE SER
MELHOR DO QUE ATÉ AQUI
QUANDO CONSIGAS FAZER
MAIS P'LOS OUTROS QUE POR TI.


(António Fernandes Aleixo).







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